Para quem cresce em cidades como Rio e São Paulo, a partir
do momento que se tem carro, passa a ser bem difícil imaginar sua vida sem ele.
Bom, até falamos no último post: as grandes distâncias, o transporte público
ineficiente e até a falta de segurança, tudo acaba levando as pessoas a se
refugiarem dentro dos seus carros. Não é à toa que o automóvel é o principal
símbolo de status que costumamos ostentar, seja quando fazemos 18 anos, seja quando
conseguimos ganhar melhor; o carro é o sonho de consumo da maioria.
Há um ano ficamos sem carro e pensamos em segurar a onda
para comprar outro. Não imaginávamos que ficaríamos tanto tempo assim. E de
boa.
Já quando chegamos aqui, vimos uma grande diferença, pois
passamos todo o tempo antes com apenas um carro para o casal. Pra quem vem de
São Paulo é impensável algum casal de classe média pra cima ter menos de 2 carros,
isso quando não tem o terceiro, para o rodízio.
Para o padrão europeu, ter carro na Holanda é caro. Ao
menos, mais caro que a média europeia. Não falo só do preço do carro, mas no
geral. Agora, comparado com o Brasil, não; vejamos:
- Carro: o carro em si, é mais barato. A partir de 6 ou 7 mil euros já dá pra comprar
um carrinho popular, como um Peugeot 107 ou um Toyota Aygo. Um Civic pode ser
comprado por € 17.000 e uma BMW 318 começa a partir de € 33.000. Fora que o
sistema de leasing permite financiar por taxas bem mais camaradas, em até 36
meses.
- Gasolina: aqui é bem mais cara. Nos países vizinhos
costuma-se pagar € 1,50 o litro, mas na Holanda sai € 1,70 (R$ 5,10). Tá certo
que uma gasolina bem melhor, que rende mais, sem adição de álcool e sem um
monte de impureza que vai ferrar seu motor um dia, mas bem mais cara.
- Estacionamento: aqui costuma ser caro apenas nos centros
das cidades, chegando ao máximo de € 5,00/hora no minúsculo centro histórico de
Amsterdam. Em outros lugares, bem mais barato ou de graça. Fora que parar na
rua não representa risco algum.
- Impostos: aqui reclamam muito que o imposto holandês é
alto. E é, paga-se até 5 vezes mais que na Espanha pra se ter um carro. Tanto
que muita gente que se muda pra cá, acaba nunca transferindo sua placa. No
chute, porém, é mais ou menos o que se paga de IPVA no estado de SP, só que com
duas diferenças: não se acha um buraco no asfalto, ruas e estradas são uns
tapetes; e não existe pedágio. Logo, imposto bem investido. Na Bélgica cobra-se
menos imposto, mas o asfalto é tão pior que sabemos onde é a fronteira dos
países sem olhar placas, apenas pelo calçamento das estradas.
Agora, é caro por um motivo: o uso de carro é profundamente
desestimulado pelo Estado, especialmente no centro das cidades. Um exemplo: nas maiores cidades (isso não só
na Holanda) tem o chamado Park And Ride, identificado pelo símbolo P+R. São
estacionamentos fora da cidade onde paga-se um valor baixo, você ganhar
tíquetes de metrô ou trem para uma ida e uma volta para o centro; pra todos os
ocupantes do carro. Por exemplo, em Amsterdam pode-se parar no estádio do Ajax
por € 8,00 por dia e ir pro centro de graça.
Voltando, então como sobreviver sem carro? Simples.
Como já falamos no post anterior, a bike é sua melhor amiga.
Em um raio de 3 ou 4km, onde dá pra fazer muita coisa, ela é até mais rápida
que o carro. É flexível, vai a qualquer canto, para em qualquer lugar e há
ciclovias em toda parte. Fora o ganho de saúde, pois já faz exercício indo pro
trabalho.
Segundo, é claro, transporte público. Pode não ter ônibus a
toda hora pra todo lugar, mas é bem confiável e costuma-se enfrentar lotações
só nos horários de rush (especialmente pela manhã) e mais no inverno, onde as
bikes ficam em casa.
Os trens também são ótima opção para as principais cidades.
Embora a NS (empresa estatal de trens) venha pisando na bola muito mais que
devesse – o que tem levado a tomar várias multas – ainda assim, dá pra contar
como um meio de transporte razoavelmente confiável.
O Car Sharing tem sido um dos nossos melhores amigos. Para
aquelas horas onde precisamos carregar compras, ira um lugar mais remoto ou
precisamos de flexibilidade, contamos com o famoso Green Wheels.
O sistema é
simples: cadastra-se e, por uma taxa de € 10/mês, temos uma frota a nossa
disposição pelo país.
Pela internet ou pelo smartphone, nós reservamos um carro
mais próximo por um horário fixo. Passamos o cartão (no caso, o mesmo cartão do
“Bilhete Único”) no para brisas, ele abre, digitamos um código e pegamos a chave.Não precisa pagar estacionamento e há vagas dedicadas para o
carro. Para a gasolina, há um cartão tipo Vale Combustível que pode ser usado
em qualquer posto e a conta vai para a Green Wheels. Claro que pagamos por ela
no valor do aluguel e da quilometragem. Pra dar uma ideia, se pegarmos um carro
por 3h e rodarmos uns 30km, pagamos cerca de € 15, gasolina incluída.
O ruim do sistema do Green Wheels é ter que devolver o carro
aonde você pegou. Há outros sistemas, como o Car2Go onde se pode devolver em outros
lugares, coisa que dá mais flexibilidade e diminui os períodos de locação. Mas,
o Car2Go, na Holanda, só tem em Amsterdam.
Para viajar, passar 2 ou 3 dias fora, aí a melhor opção é o
aluguel normal de carro. Com a vantagem que aqui é muito mais barato. Pra dar uma ideai, pra pegar um carro no
sábado e devolver na terça (3 dias) dá pra pagar a partir de € 73, por um
Twingo ou € 93 por um Megane. É menos que os € 120 mensais que pagávamos de
estacionamento no centro de Eindhoven, quando tínhamos carro. Menos do que os
R$ 200 que pagamos por um dia de um Renault Sandero no Rio de Janeiro, na nossa
última viagem ao Brasil.
Isso tudo sem precisar usar táxi, que aqui é caríssimo. Em
um ano, só peguei táxi uma vez e isso porque era uma emergência; se tivesse
tempo, dava pra ter ido de bumba.
Sim, você tem que se adaptar, os aplicativos de transporte
público para smartphones (9292ov para ônibus e NS para trens) são essenciais e
você também aprende a se planejar melhor.
Sim, voltaremos a ter outro carro, afinal, a flexibilidade e
o conforto ainda contam. Mas, o fato é que há vida sem automóvel. E uma vida
boa. Agora, a não ser que surjam circunstâncias muito específicas, duvido que
tenhamos 2 carros.
Por fim, importantíssimo: ninguém aqui te julga pelo carro
ou pela falta dele. Muita gente rica não tem carro, muita gente que poderia ter
um BMW escolhe ter um Fiat 500 porque é mais prático. Símbolos de status pra
holandês são outros, certamente não o carro.
Nenhum comentário:
Postar um comentário